06/01/2016
08:53

Áudios gravados durante as investigações que resultaram na Operação Damas de Espadas mostra proximidade do Governador Robinson Faria, do procurador geral de Justiça Rinaldo Reis e do ex-presidente da Assembleia Legilativa Ricardo Motta, com a principal investigada, Rita das Mercês Reinaldo.

O Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN), com autorização judicial, interceptou ligações telefônicas, em agosto de 2014, do vice-governador e então candidato ao governo do Estado, Robinson Faria, com a ex procuradora-geral da Assembleia Legislativa, Rita das Mercês Reinaldo.

Segundo o MPRN, o governador buscou informações sobre a investigação que resultou na Operação Dama de Espadas, que investiga suposto desvio de R$ 5,5 milhões da Assembleia Legislativa do Estado.

De acordo com o áudio interceptado, Robinson ligou para Rita e a questionou sobre o fato de algumas pessoas que trabalhavam lá estarem sendo intimadas para depôr ao MP.

Nas gravações obtidas pelo G1, Rita das Mercês é o elo de ligação entre o governador Robinson Faria, o procurador-geral Rinaldo Reis e o ex-presidente da AL Ricardo Motta.

Confira a transcrição dos áudios dos acusados:

Robinson Faria com Rita das Mercês:

ROBINSON – (…) O que é que você está achando disso ai? É o que?

RITA – É. A gente tá trabalhando, né? O presidente tá trabalhando. Já trabalhou já hoje, certo?

O “trabalho” citado na conversa entre Robinson e Rita seria uma conversa entre Ricardo Motta e o procurador-geral de Justiça do RN, Rinaldo Reis. Na manhã do mesmo dia 26 de agosto, Rita teria participado de uma reunião entre Ricardo e Rinaldo na Assembleia Legislativa.

RITA – (…) Eu dei a entender hoje na hora da reunião lá que não era interessante pra ele lá, porque agora um negócio que está para prescrever, né? (…) Ele disse: “vou procurar me inteirar e tal”. Eu disse: “inclusive você viu, você estava na minha sala semana passada quando chegou e eu mostrei e tal”. Aí ele disse: “Não. Eu vou procurar me inteirar e tal. Não é o momento. Vou reunir com o pessoal. Vou conversar, porque não é o momento. Vou conversar”.

Robinson Faria foi presidente da Assembleia entre 2003 e 2010. Durante este período, Rita, que já era procuradora-geral, manteve-se no mesmo cargo. Em outro trecho da conversa, ele perguntou a Rita das Mercês sobre qual época seria a investigação do Ministério Público.

ROBINSON – (…) É avulso? Ou é de um período só, ou uma certa época?

RITA – Avulso. Avulso.

ROBINSON – Tem atual e atrasado ou de época só? Ou certa época?

RITA – Tem só atrasado, só de atrasado. Tem gente já exonerado, entendeu? Tem gente efetivo. Tem aposentado, sabe? Fizeram uma miscelânea lá.

Em uma segunda interceptação de conversas entre o governador e Rita, ela fala da dificuldade do MP prosseguir com as investigações.

RITA – (…) Como o presidente colocou, ia ficar mal para a própria instituição, né?

ROBINSON  – Sim.

RITA – Ser usada pra isso…

ROBINSON – E… e não pode fazer nada à revelia do chefe, do diretor?

RITA – É, ele disse que ia conversar e tal, que eles têm independência. Mas eu acho que ele tem um pouco de influência.

ROBINSON – Tem, tem. Ele é de lá.

RITA – Ele é de lá. (…) Eu acho que ele tem um pouco de influência.

A conversa entre Robinson e Rita, que dura quase 10 minutos, é concluída com ele dando a certeza que seria eleito governador do Rio Grande do Norte.

ROBINSON – Vamos ver, né? E a outra parte aqui vai dar certo, viu?

RITA – Vai dar certo! Se Deus quiser.

ROBINSON – Vai dar certo, vamos ganhar, viu?

RITA – Vamos embora, vamos ganhar. E outra coisa: eu não quero mais ficar na Assembleia não (risos).

ROBINSON – (Risos) Vamos comigo, eu vou tirar você dai.

Após a operação Dama de Espadas, Rita das Mercês foi exonerada do cargo de procuradora-geral da Assembleia Legislativa e atualmente está proibida de entrar no local.

Ricardo Motta

Outra interceptação feita pelo MPRN revela que o ex-presidente da Assembleia Legislativa, Ricardo Motta, também estava empenhado para saber o motivo das intimações emitidas pelo MP.

Na ligação, Motta exige que Rita ligasse para o procurador-geral de Justiça, Rinaldo Reis, solicitando um posicionamento sobre a investigação.

Confira:

MOTTA – Ei, mais tarde dá um toquezinho pra Rinaldo pra saber se ele tem alguma posição. Quando ele quer as coisas ele liga pra gente.

RITA – É. Mas não ligou. Não deu retorno.

MOTTA – Mais tarde você liga, mais no final da manhã. “Rinaldo, tem alguma posição?” Entendeu?

Rinaldo Reis

Enquanto Rita das Mercês buscava informações sobre as investigações da Dama de Espada com Rinaldo Reis, o procurador-geral também buscava junto a ela informações sobre o andamento e votação de lei na ALRN.

O Projeto de Lei Complementar nº 025/2014, que mudificou a forma de indicação dos candidatos a desembargador, foi uma iniciativa do próprio Rinaldo Reis e aprovada na CCJ e no Plenário da Casa, um dia após as gravações entre o procurador-geral e Rita.

Confira:

RINALDO – (…) Ritinha, é rápido. Você sabe dizer se está realmente pautado? Eu tentei até falar com Israel agora, mas ele não atende o telefone.

RITA – Pronto. Eu saí agora de uma reunião com o presidente e ele e está com o relator Kelps [Lima, deputado estadual]. Aí até o presidente insistindo pra levar (…) o processo amanhã pra reunião da comissão e perguntou se você tinha conseguido falar com os líderes. Conseguiu falar com alguém?

RINALDO – Não. Eu vou ligar. Eu tentei, eu tentei falar com todo mundo semana passada, mas era todo mundo com o telefone desligado.

RITA – Desligado, né?

RINALDO – Agora mesmo tentei falar com Hermano [Morais, também deputado estadual] e não consegui, que era pra saber já de alguma novidade.

Rita lembra que os deputados, no mês de agosto de 2014, estavam na fase final da campanha eleitoral:

RITA – Porque nesse período é complicado a gente botar esse povo aqui dentro, né?.

RINALDO – Eu sei. Eu sei.

No dia seguinte a essa gravação, Rinaldo Reis volta a telefonar para Rita das Mercês, dizendo que já estaria na “casa” dela, referindo-se à Assembleia Legislativa. A interceptação foi feita às 9h15:

RINALDO – Estou aqui na sua casa já. Na sua casa de trabalho, entenda.

RITA – Já? Oh, coisa boa! Que maravilha (…)

RINALDO – Você está por aqui, Ritinha?

RITA – Tô. Você está em cima, na Comissão?

RINALDO – Não, não. Eu estou aqui na… Não, não tem ninguém na CCJ, eu queria saber se a gente tinha como localizar Kelps, Hermano alguns desses aí antes da gente começar.

O outro lado

O governador Robinson Faria foi procurado pelo G1. Ele emitiu nota através da Assessoria de Comunicação do Governo do Estado. Leia a íntegra:

“O governador Robinson Faria não foi citado pelo Ministério Público Estadual como parte nas investigações da Operação Dama de Espadas.

Tendo sido deputado estadual por 24 anos, e chegado a presidência do Legislativo, Robinson Faria conviveu e estabeleceu laços de amizade e respeito com vários servidores da Assembleia.

A relação do governador com o MPRN é de profundo respeito e diálogo por defender a contribuição essencial da instituição para a Democracia brasileira”.

O deputado Ricardo Motta, por telefone, disse não se recordar do que se tratava a conversa que teve com Rinaldo Reis e Rita das Mercês.

“Como presidente da Assembleia, sempre procurei conversar com todas as instituições. Mas não me lembro do teor dessa conversa especificamente”. Indagado se tinha procurado saber do que se tratava a investigação do MP, ele negou. “Nunca procurei o doutor Rinaldo Reis para saber de investigação alguma do Ministério Público”.

Rinaldo Reis admitiu que conversou com Ricardo Motta, que lhe fez perguntas sobre as intimações emitidas pelo MP.

“Encontrei o deputado Ricardo Motta por duas ou três vezes pessoalmente na Assembleia nessa época. Ele me perguntou do que se tratava esse inquérito civil e eu disse a ele que não sabia, até porque os promotores têm sua independência em qualquer investigação. Realmente disse que iria procurar me inteirar e assim o fiz. Perguntei a promotora responsável pelo caso do que se tratava e, à época, nem mesmo ela tinha nada de concreto, informando que se tratava de algumas possíveis irregularidades.

Passei esse conteúdo para o deputado Ricardo Motta, até porque não havia nada de mais. Jamais eu passaria se a investigação estivesse avançada e em nenhum momento sugeri que ela fosse protelada. Ninguém nunca me pediu para travar nenhuma investigação, até porque não encontraria espaço para isso comigo”.

Sobre o fato de procurar os deputados Hermano Morais e Kelps Lima para tratar da aprovação do projeto de lei, ele disse ser um procedimento normal. “Isso é normal, legal e não acho que seja antiético. Na condição de procurador-geral de Justiça, sempre conversei com os deputados para esclarecer projetos de interesse do Ministério Público”.

Hermano Morais lembrou que em agosto de 2014 era presidente da CCJ. “Sempre que havia algum projeto do MP na Casa, o doutor Rinaldo se apresentava pessoalmente para explicar do que se tratava, mas sempre mantendo a ética. Ele chegou até a participar de reuniões na CCJ conosco”.

Através da assessoria de imprensa, o deputado Kelps Lima disse que em “todas as sessões, os deputados relatores são procurados pelas mais diversas entidades pedindo agilização de projetos: TJRN, Governo, MP, TCE, Sindicatos, OAB, ONGs. Nenhum projeto foi aprovado pela Assembleia em 2014 sem passar pelo menos na CCJ, apesar do regimento autorizar a aprovação direta sem nenhuma Comissão, desde que acordada pelos líderes”.

Rita das Mercês não foi localizada. Por telefone, o advogado dela, Flaviano Gama, disse que só vai se pronunciar nos autos do processo.

Mossoró Hoje

Publicado por: Chico Gregorio

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