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A Suprema Corte, para o bem ou para o mal, recentemente foi levada a decidir sobre a descriminalização do aborto de fetos anencéfalos; a autorização de pesquisas com células-tronco embrionárias humanas; a proibição do financiamento empresarial de campanhas eleitorais; a vedação de greve no serviço público; a legitimidade das cotas raciais no ensino estatal; a extensão dos direitos da união estável de casais heterossexuais aos parceiros homoafetivos; o estabelecimento de um marco temporal para a delimitação de terras tradicionalmente ocupadas por indígenas; a retroação dos efeitos da denominada “Lei da Ficha Limpa”; a possibilidade da mudança de nome das pessoas transgênero; a restrição da garantia da presunção de inocência; a limitação do habeas corpus; e o fim do foro especial para os parlamentares.
Certos observadores mais comedidos entendem que os juízes, ao apreciarem temas de tal envergadura, estariam apenas preenchendo, embora de forma heterodoxa, um momentâneo vácuo de poder.
Outros mais irreverentes identificam-nos com os reis-filósofos preconizados por Platão. Todos, no entanto, são unânimes em afirmar que, por mais bem-intencionados que sejam, não lhes é lícito alterar, pela via interpretativa, o sentido da Constituição e das leis que juraram defender.
Por isso muitos pugnam pela integral restauração do mecanismo de freios e contrapesos, que tradicionalmente integra nosso regramento constitucional, temendo que algum desavisado cogite da dissolução do Legislativo e Executivo ou, até mesmo, da abolição das eleições.
Ricardo Lewandowski
Professor titular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e ministro do Supremo Tribunal Federal
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