Um trecho mais que didático do artigo do competente e equilibrado analista de economia João Paulo Kupfer, hoje, em O Globo:
Para o presidente Michel Temer e seu ministro da Fazenda, Henrique Meirelles,(…) bastou um único trimestre de crescimento — e de crescimento (mal) sustentado em eventos excepcionais — para que eles soltassem fogos comemorando o fim da recessão. Entende-se o desejo, o exagero e, por consequência, a afoiteza das autoridades, quando se está diante de um governo não só sabidamente impopular como também acossado pela perspectiva de não completar o seu turno.
Há consenso de que o resultado se deveu a um excepcional desempenho do setor agropecuário, na esteira de uma safra recorde de grãos, combinado com o momento favorável dos preços internacionais de commodities, sobretudo as agrícolas, impulsionando exportações. Difícil encontrar, nesse resultado, o dedo da política econômica de Temer, concentrado até aqui quase exclusivamente em atender interesses capazes de contribuir para a aprovação das reformas prometidas aos aliados e em se manter no cargo. Acrescente-se a isso os números mais favoráveis, obtidos depois de alterações metodológicas nas pesquisas mensais do IBGE do comércio e dos serviços, questionados por muitos especialistas.
A verdade é que ninguém vislumbra, para os próximos trimestres, sequência virtuosa no comportamento da economia. É quase certo que a atividade vai desacelerar entre abril e junho, com risco de que venha a sofrer uma nova contração. Depois de puxar o trem no primeiro trimestre, projeta-se contribuição negativa do setor agropecuário para o segundo, ao mesmo tempo em que os indicadores coincidentes, no período, sugerem uma economia rondando a estagnação. Não existe outro nome para expressar as projeções de um crescimento entre zero e 0,5%, no conjunto de 2017, depois de um recuo acumulado superior a 7% nos dois anos anteriores.
Entende-se melhor essa tendência à estagnação quando os resultados do PIB do primeiro trimestre são desagregados. No lado demanda, consumo e investimento, ainda que com menos intensidade, mantêm-se em terreno negativo, afetados pelo desemprego elevado, o endividamento alto e o crédito emperrado. A trajetória é de contrações menos intensas, mas se já faltava tração aos fundamentos econômicos para reverter o quadro de fraca atividade, a crise política que atinge o coração do governo Temer só veio reforçar a tendência.
Via Fernando Brito
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